domingo, 14 de abril de 2013

O camundongo e a madame


(Para Sofi, que é esperta como um leão e come como um ratinho)

Era um camundongo muito distinto, pois tinha por distração degustar nobres queijos.
Para que fique claro não ser este um caso banal, cabe distinguir tal hábito de outros, próprios dos demais camundongos deste mundo, que, nos últimos milênios, devoraram qualquer alimento, resultante ou não da coagulação e fermentação do leite.
O nobre roedor se afirmava pelo requinte e moderação, visto que não se dava a roer queijos com o destempero próprio dos de sua espécie, mas degustava-os como quem busca alimento para a alma, deleite para o espírito.
A apreciação –como discorria o esperto animal– exigia conhecer não só a procedência do produto, como também seus modos de fabricação:
   -    Moldagem e coagulação!
   -    Salga e pasteurização!
   -    Acabamento e maturação!
Atentar ao queijo que iria consumir –se maturado por fungo ou bactéria– era tratado pelo animal como coisa séria, lhe servia ao apetite e dava muito prazer.
Só não dava prazer à madame Lili, iniciada na arte de bem receber, nos segredos do bem-viver, e anfitriã involuntária do camundongo.
Desgostosa de partilhar sua mansão e as refeições com tão asqueroso ser, disposta a não mais aturar impertinências, Lili ordenou ao mordomo dar cabo do animal.
O mordomo, escolado nas taxas de desemprego do país, tratou de cumprir com zelo a missão. Mas, altivo que era, negou o uso da pobre e cruel ratoeira.
Preferiu outros subterfúgios, bem possível que esperando um desfecho mais intrincado, mais cinematográfico, e passou a travar franco diálogo com o camundongo:
-       Posso servi-lo emmenthal... com absinto, excelentíssimo rato?
-       No thanks, prefiro gruyère, emproado criado!
-       Talvez, munster, com... cicuta?
-       Pardon, hoje estou mais para sbrinz.
-       Permita oferecer-lhe géromé, com... arsênio?
-       Oh gracias, but I prefer pont-l’evêque.
-       E um fino cammembert, com... malation?
-       Excuse, mas terias livarot?
Aturdido ante a astúcia do animal, o mordomo abriu mão da pompa, arregaçou as mangas em seda e passou às vassouradas, mas erro-as a não poder mais e, então exausto, deu-se por vencido.
Diante de tão indecoroso desfecho, madame Lili prostrou-se e lhe foi diagnosticada fina depressão.
Ao mordomo então restou apenas zelar pelos caprichos da senhora:
-          Aceita cheddar, madame?
-          No thanks, prefiro um port-salut... com Prozac!

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