quinta-feira, 29 de agosto de 2013

quarta-feira, 28 de agosto de 2013

domingo, 25 de agosto de 2013

Inácio, o galináceo ()

Inácio, o galináceo, por muito tempo lançou ao alto seu canto, anunciando aos homens o alvorecer e a hora da labuta.
 Mas a cidade cresceu, abraçando o terreiro de Inácio. Mesmo em quintal emparedado, o galináceo empoleirado insistia no ofício, louvando manhãs e os homens laboriosos.
Mas os oficiais de escritório acordam tarde, e se exaltam com os louvores das manhãs, estrilam com quem tagarela às madrugadas.
E todos devem se submeter à municipalidade: o homem, o cão, os bodes; até as galinhas botadeiras estão sujeitas às posturas municipais.
A princípio, Inácio deixou de sustenidos e passou a cantarejar; mesmo assim, não contente, o povo de escritório levou o galináceo a trilhar outras veredas, arrastando consigo tão somente uns poucos cacarecos. 

sábado, 24 de agosto de 2013

laceios...

No vagão apertado, com o mundo sobre os ombros a lhe pesar, ele desabafa: “Dilacerada minha alma aqui está, quisera eu lacear a gravata e leve gravitar em céu desanuviado”

sexta-feira, 23 de agosto de 2013

bufante... ()

Bufa, bufa o moço ao passar da menina de apressados passos; bufa o moço, porque o vestido que passa é laceado, porque a menina é delicada, quase franzina, e passa folgada no vestido franzido; bufa o moço, pois a menina tem no corpo vestido folgado e leva de ombros os panos bufantes. 

quinta-feira, 22 de agosto de 2013

feira...()

"Qual é o preço senhor das traquitanas que dispões tão cuidadoso no chão, sobre surrado manto?
Qual é o preço senhor de tão nobres mercadorias, cuja estima exige do cliente um ajoelhar cheio de mesuras?

Qual o preço senhor das finas jóias que ordenas no asfalto, bugigangas com trato lapidar de ourives?
Quanto vale o seu madrugar após noite tão fria?

praça...

Ao final da tarde e  nem aí para o frio, ele conduz a tosca bola em direção ao gol...

quarta-feira, 21 de agosto de 2013

livraria... ()


Refestelado na poltrona e no abrigo dos livros, ele esboçou sorriso com os argumentos amorosos de Eça de Queiroz:

“Amei aquela criatura. Amei aquela criatura com amor, com todos os amores que estão no amor, o amor divino, o amor humano, o amor bestial, como Santo Antonino amava a Virgem, como Romeu amava Julieta, como um bode ama uma cabra.”

terça-feira, 20 de agosto de 2013

invernais...

Safo da ordem que rege os passantes, acobertado em finos trapos, seus olhos aparentam leitura recente de Nietzsche:

“O inverno, um hóspede ruim, está em minha casa; azuis estão minhas mãos, graças ao aperto de mão dessa amizade.
Eu respeito esse hóspede ruim, mas de bom grado o deixo sozinho. Fujo de sua presença; e, quando se corre bem, escapa-se dele!
Com pés e pensamentos quentes corro para onde o vento está parado – para o canto ensolarado de meu monte das oliveiras.
 (...)
É um hóspede duro – mas eu o respeito, e não rezo, como os fracotes, ao barrigudo ídolo de fogo.
É ainda melhor bater um pouco os dentes do que adorar ídolos! – assim quer meu feitio. E detesto especialmente os ardorosos, fumegantes, abafados ídolos de fogo.
Quem eu amo, amo-o melhor no inverno do que no verão; zombo melhor e mais efusivamente de meus inimigos agora, desde que o inverno está em minha casa.
(...)
Eu – um que se arrasta? Jamais na vida me arrastei ante poderosos; e se alguma vez menti, menti por amor. Por isso, estou também alegre no leito de inverno.
Um leito magro me aquece mais que um leito rico, pois tenho ciúmes de minha pobreza. E sobretudo no inverno ela me é mais fiel.
Com uma maldade dou início a cada dia, zombo do inverno com um banho frio: isso faz resmungar meu severo amigo de casa.
(...)
Todas as coisas boas são de origem múltipla, – todas as coisas boas e travessas pulam de prazer para dentro da existência: como poderiam elas fazer isso apenas – uma vez?
Coisa boa e travessa é também o longo silenciar e, como o céu de inverno, o olhar de um rosto luminoso de olhos redondos. –
– como ele, silenciar seu sol e sua inflexível vontade solar: em verdade, aprendi bem essa arte e essa petulância de inverno!”


corpo...


segunda-feira, 19 de agosto de 2013

livraria... ()

Acossado, ele ali se refugia; e anseia por um  minuto só, um só minuto de sombra e de silvar do vento. Ali, entre penumbras, surra-lhe Eça de Queiroz:

"Daquela janela, aberta sobre as serras, entrevia uma outra vida, que não anda cheia do Homem e do tumulto da sua obra".

domingo, 18 de agosto de 2013

sábado, 17 de agosto de 2013

sexta-feira, 16 de agosto de 2013

mentes intumescidas...

Algo contra o sexo mecânico, fortuito, calado?

Não, nada a opor.  Só que o entrelace de mentes, –perdoem a baixa expressão– o encoxamento de raciocínios, é tanto essencial quão excitante...


quinta-feira, 15 de agosto de 2013

frio...

O frio lhe fustiga o rosto. O casaco é pouco e a meia não conforta. Ele segue em passos rápidos e se lança metrô adentro.

nua...


quarta-feira, 14 de agosto de 2013

terça-feira, 13 de agosto de 2013

O camaleão ()

O camaleão era ardiloso,
astuto, sagaz.
Escolado no disfarce,
animal dissimulado,
rei do mimetismo,
podia fazer da pele
argila bruta ou seda fina.

Acobertado em campo aberto,
oculto em plena luz,
dissimulava a existência
ao abrigo da fome alheia.

Coberto por tais qualidades,
não era camuflado apenas
no pecado das vaidades.
Soberbo,
Ficava nas manhãs ao sol,
impalpável em sólida pedra.

Só não contatava com fato cruel e dolorido:
o elefante – que pesado! –
sentou na pedra distraído.

corpo...


segunda-feira, 12 de agosto de 2013

rosas...

Em noite de inverno, o homem cheio de letras ouviu às suas costas: “Que jardim rosido!” 
Quis assim a trilha do acaso indicar encanto ao regrado homem por tortuosa frase.
Mesmo que de passagem, ele pensou: “Pro diabo todo capricho gramatical,  humores todos da sintaxe, todo cabresto morfológico! Por que haveria eu de insistir que florido o jardim é, todas rosas ele tem, se muito mais ele pode ser, se tão somente “rosido” ele é. Ah, esta moça que não ouso saber quem é, tem a voz macia e sabe tudo de bom português”.

segunda-feira, 5 de agosto de 2013

menino... ()

O menino descobre o mundo pelo futebol. E sonha com seu mundinho, com bola, sol e passarinho...

sábado, 3 de agosto de 2013

alienações...

Lá fora
Manifesto.

Lá fora
Pétreos garotos.

Meninos de pedra
Meninos depredam.

Doutro modo
Protesto.

Aqui dentro
Meu anseio
É seu seio.

Aqui dentro
Meu pleito
É seu peito.