domingo, 6 de outubro de 2013

As antas e os saguis ()

Na mata se percebia uma estranha relação, das antas com os saguis.

Não se sabe por que diabos, mas desde que as antas se conheciam por antas, e os saguis por saguis, a coisa ocorria assim.

Os saguis, algo macacos que eram, perturbavam, azucrinavam, apoquentavam as pobres antas. As antas, antas que eram, aceitavam impassíveis as provocações.

Talvez por força do tempo, ou vício do hábito, os mamíferos de rabo curto se tornaram cada vez mais indolentes e também obedientes; já os primatas de cauda longa, mais salientes e exigentes.

 Como entendiam natural, os saguis, animais pouco letrados, mas versados na arte do viver folgado, faziam das antas burros de carga.

Assim, as antas servis passaram a atender os caprichos dos saguis. A coisa era tão arranjada que cada anta servia a um membro da macacada.
  
Ocorre que uma das antas não era tão anta assim. Não sendo tão anta, ansiava que aquela situação um dia tivesse fim.

Então, num dia como outro qualquer, um dos saguis ordenou: “Anta, não tenha por banal aquilo que lhe compete, deixa de moleza e atenda sua realeza!”.

E continuou seus xingamentos: “Anta ralé, tire meus bichos-de-pé e me faça cafuné! Anta sem esperança, faça-me sombra com sua enorme pança!”

Aproveitando a deixa, e não disposta a mais tormento, a anta, bicho estudado, sentiu que chegara o momento e sentou seu corpo pesado no sagui, bicho folgado.

Impassível, limpando seus óculos sobre o sagui ali estatelado, e diante de seus pares espantados, a anta pôs-se outra vez de pé apenas para citar Brecht: “Não achem natural o que muito se repete!”.

Mais que depressa, todas as gordas antas se sentaram nos esquálidos saguis.

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